terça-feira, 29 de abril de 2014

Abril, 16.

Outro dia uma das minhas melhores amigas me ligou e, de súbito, desabafou comigo dizendo que terminaria um namoro que durara mais de três anos. Não sei, sabe? Ela aparentemente vivia um relacionamento almejado por muitos, de modo que o amor que ela e o namorado expressavam um pelo outro sempre foi meu referencial de inabalável. De repente... ROMPERAM! Pra ser sincero eu só consigo pensar no quão estranho é isso tudo. Mais estranho ainda é que eu tenha o ímpeto de escrever sobre isso justo agora. É estranho começar falando sobre a história dessa amiga quando sei que não estarei discorrendo sobre ela quando colocar meu ponto final aqui. 
Na parede do meu quarto o meu relógio marca pouco mais de meia-noite, o que segundo o calendário, significa ser a data do meu aniversário. Daqui, a estranheza que mencionei há pouco se mistura a algumas outras sensações numa sinestesia perfeita de amargura e tristeza. Não é surpresa que esse dia me presenteie com certa melancolia, foi assim nos últimos anos. Isso não é estranho.
Acontece que pela primeira vez eu consigo identificar uma razão.
No meu vigésimo segundo aniversário eu consigo enxergar que essa falta tem seu jeito, seu cheiro, seu gosto. O rosto dessa falta é o seu. O estranho nesse dezesseis de abril é não ter você.
Eu queria pegar os presentes, o bolo, a festa e cada uma das vinte e duas velas. Queria juntar isso tudo e ir em algum lugar em que pudesse trocar por uma chance de reviver outro momento, como aquele em que há exatos doze meses você chegasse atrasado de novo no meu dia, trazendo consigo uma camisa básica barata e que eu adorei, típico presente de última hora, daqueles que a gente escolhe às pressas só pra não chegar de mãos vazias. Bobagem da sua parte.
Você poderia ter chegado com a chave de uma BMW, as passagens de um Cruzeiro Transatlântico ou mesmo sem presente, sem aviso e sem motivo. Eu te amaria do mesmo jeito. Muito. Digo isso porque é era tudo o que eu queria que você fizesse agora. Porque não bastasse a estranheza que é isso tudo até aqui, é mesmo estranho que depois de um tempo razoável eu ainda precise das suas mãos vazias pra encher meu peito. É desesperador saber que ainda hoje essas suas mãos tão vazias são as únicas capazes de costurar os espaços que você não teve o cuidado de evitar que ficassem em mim quando resolvesse partir.

Hoje, quando eu soprar minhas velinhas, ainda será você o meu desejo de aniversário. Mas enquanto eu não as sopro e te peço de volta com todo o fôlego dos meus pulmões, eu desejo que essa chama de você apague logo dentro de mim. Eu desejo que essa centelha se esfrie em cinzas. É que por mais estranho que isso possa ser, eu não aguento mais as queimaduras que a sua ausência me provoca.

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Sinal Vermelho

Nem mais uma palavra escrita!” Essa foi a penitência que me dei depois da última vez, quando escrevi e expus os meus cortes, um a um, todos em carne-viva, numa tentativa de elevar a dor dos sangramentos ao máximo, pra doer tanto que depois daquela agonia desesperadora que eu me provocaria, eu pudesse finalmente não sentir mais nada.
Era isso, enfim. Havia desistido de escrever sobre os meus amores do passado e também do futuro,  achava que assim estaria afastando algum tipo de maldição que eu acreditava ter. Parei porque estava cansado, farto de num dia ser capaz de ver os milhões de tons das milhares de cores que havia em tudo e no outro ver alguém indo embora e assim assistir o meu mundo ficando cinza novamente. Ver a pessoa que amamos partir tem sempre uma angústia desconcertante, é como ter o pavor latente de sentir alguma parte nossa sendo amputada e, por puro reflexo, mexer cada membro do nosso corpo e confirmar que tudo ainda está lá, e que por isso, por estarmos fisicamente inteiros, não há anestesia capaz de resolver. A melhor das soluções que eu consegui pensar foi ouvir o meu grito. E como que diante de um congestionamento, em algum lugar caótico dentro de mim, eu reagia aos meus semáforos internos e me sentenciava: “PARE!”
De lá em diante resolvi ceder ao meu instinto emergente de autoajuda e cuidar de mim. Eu estava em pânico. Imaginar que agora eu seria a companhia de mim mesmo era detestável, eu odiava a ideia sem sequer ter experimentado isso de mim. Achei que não voltaria a me acostumar, que viveria à sombra dos meus fantasmas, tive certeza que não suportaria. Não só suportei como fui feliz. Pela primeira vez em algum tempo eu ri até que as lágrimas caíssem e solucei de tanto chorar por coisas minhas, por um cotidiano massante, mas que era só meu. Isso não deixava de ter algum encanto, afinal, eu, que sempre associei toda a adrenalina emocional da minha existência a um ser genérico, lembrara que tinha uma vida, mesmo que não conseguisse mais esboçar muitas linhas sobre ela ultimamente,  por mais que eu tentasse. Eu quis por um freio em apenas um detalhe, queria escrever sobre outras coisas importantes, mal sabia o quanto esse  pequeno detalhe era importante e determinante em mim.
Você apareceu e eu continuei respeitando a minha promessa com todo o rigor. Era um desafio constante, sabe? Vi dezenas de versos escorrendo de você e se acumulando na minha cabeça, que eu insistia em manter tão cheia. Era pra te preservar! Era pra me preservar! Pra proteger qualquer coisa boa que estivesse acontecendo. Eu tinha medo de por tudo no papel, não queria desencadear uma contagem regressiva quando colocasse um ponto final. Por isso eu reagia cético às suas investidas, entende? Custei a admitir que apesar de eu ter estado muito bem sem você, tudo agora era muito melhor ao seu lado. Recebi seus gestos de carinho receoso, temia continuar a querê-los e, apesar do meu medo, aconteceu.
Não adiantaram as minhas placas de advertência, de nada valeu ter cavado trincheiras emocionais. Não muito tempo depois do nosso primeiro beijo eu já tinha o gosto como algo familiar, era cedo e eu já havia gravado muitas das expressões do seu rosto, não raro eu as via quando fechava os olhos. Eu sorria. Quis parar tudo, sair correndo antes de ser dilacerado de novo, fugir pra perto de qualquer coisa que fosse preto-e-branco, de lá eu saberia o que esperar. Lembrei que você não estaria lá. Desisti. Fiquei, mesmo tonto de tanto pensar.
Eu queria tanto dizer que sim ou que você dissesse que acabei me rendendo. Ali, à luz daquele sinal vermelho, o carro estava parado e o tráfego era tranquilo.Naquele momento eu resolvi desatar os meus grilhões e sair da minha cabeça. Seu olhar estava especialmente confortante e sua voz, num misto de grave e doce, consumou em resposta desconcertada ao meu pedido repentino. E por diante dessa alegria não caber silêncio é que eu escrevo. Sim, porque da mesma forma, não cabe recusa perante o seu abraço. Àquela altura eu já sabia não só mais das linhas, mas do título e aguardava o momento oportuno para que eu pudesse escrevê-lo, pra dizer que eu parei, eu parei de querer parar! Parei sim! Saí da minha cabeça, porque eu queria dizer não só da sua importância, ou de das suas qualidades, ou do seu sorriso que desarma tudo, mas, e principalmente, sobre o quão feliz eu estou por você estar aqui.

sexta-feira, 4 de maio de 2012

Das Marcas Que Carregamos


Subitamente se apercebeu novamente sozinho com os seus pensamentos. Sedento por qualquer indício que lhe pudesse fazer lembrar os sentimentos bons das pessoas, recorre —como lhe era costumeiro — a seu pequeno acervo portátil de lembranças cantadas. Senta-se à beira da calçada, liga seu “áudio player” e, enquanto o som em seus ouvidos acessava suas memórias e atingia os seus desejos mais profundos de final feliz, ele observava do alto o movimento dos carros e pedestres na avenida.
Não crescera muito, afinal. Quase se lamentou por isso. Acontece que a vida foi lhe preenchendo a mente com dramas tão maiores que quase nunca se lembrou de murmurar sua pouca estatura. Sua alegria, a imagem que por muito tempo teve de si mesmo, seus relacionamentos conturbados, sua falta de atenção, sua família ingerindo doses homeopáticas de um colapso inevitável... Era tudo muito denso, emotivo demais, forte demais, sofrível demais e, por algumas muitas vezes, exagerado demais.
Mas é assim que todos são, afinal, certo? Como qualquer um, ele fora costurado cuidadosamente a pequenos apanhados de forte carga emocional, amarrado a ímpetos efêmeros e a perigosas buscas por eternidade. Sua estrutura é basicamente essa, uma tentativa interminável de fazer de sua existência um prolongado último capítulo da sua série favorita. Série esta, que como todas as outras séries que começou a ver, jamais terminou, ora por falta de tempo, ora porque não tinha vontade, quase sempre por esquecimento, mas isso  não importa. Ele apenas se identificava, e isso lhe era suficiente para tomá-la para si. Fato é que era solitariamente confortante estar sentado àquela calçada mal iluminada enquanto as pessoas transitavam frenéticas logo abaixo. 

Ao passo que sua trilha sonora se misturava àquela orquestra ensurdecedora e desajeitada de buzinas automotoras, ele quase era capaz de ouvir os pensamentos daquelas pessoas. Quantos, assim como ele, estariam, à sua maneira, seja com suas próprias músicas, ou com aquele mesmo livro que sempre levam a tiracolo, ou até aquela mesma novela mexicana reprisada pela quinta vez na televisão... Quantos estariam tentando atribuir alguma intensidade a seus roteiros vitais mal escritos? Quantos se encontravam olhando para dentro de si, desamassando os papéis onde com tanto entusiasmo esboçaram os seus sonhos?
Ele, que sempre se sentira sozinho em meio a tantas aflições e hipérboles sentimentais, depois de tanto tempo, ainda que por alguns instantes, percebeu o quanto todas as outras pessoas se assemelhavam a ele. E que meio a sorrisos tão sinceros, numa visão pouco mais adiante das vidas mais perfeitas, além dos mais cortantes olhares de desprezo, há sempre alguém amedrontado e ferido tentando não cair no chão novamente.
No final das contas, era prepotência sua se julgar o único a chorar suas feridas não cicatrizadas. Certamente há muita gente lá fora contaminada por esse câncer por vezes irreversível chamado desapego, mas se ele mesmo não fora alcançado ainda, não poderia outro estar a salvo também?
Seja qual for o resultado dessa epifania, cedo ou tarde haveria de se encontrar alguma razão para tudo isso. E enquanto esse aguardado momento não chegava, ele, agora andando imperceptível e tranqüilo em meio aos transeuntes que observava, por agora cantarolava despreocupado, repetindo para si, acompanhando a melodia, que tudo isso pouco importava. Convencendo-se de que por hora ele só precisava continuar a seguir de volta o caminho de casa.  

segunda-feira, 12 de março de 2012

O Que Eu Não Te Falei


E assim foi. Com um beijo e todo o meu amor eu te vi partir e comecei a contar cada segundo até que você voltasse e eu pudesse te abraçar de novo. As coisas estavam mesmo muito complicadas, não é? Te vi levando uma queda atrás da outra e, sem poder fazer muita coisa pra te levantar, tentei te dar toda a força que eu pudesse, na esperança de que te servisse. Você sempre acreditou em energias, achei que as minhas te pudessem ser úteis, pensei mesmo que não poder te dar nada de concreto naquele momento não fosse uma falta tão grande. Então pedi pela sua ida e por todo esse tempo em que você fosse ficar fora, pra que você ficasse bem, que a tristeza cessasse, que você pudesse voltar a sorrir, que você pudesse se realizar de novo logo... Mal sabia eu que você estava indo e não voltaria, não pra mim. A pessoa de quem eu me despedi naquele dia e que disse me amar estava indo embora de vez. É. Não é o fim em si que me incomoda, sabe? Os casais se desfazem o tempo todo. Dói, mas esse não é nem de longe o maior dos sofrimentos. Foi um final atípico, de motivações aparentemente atípicas, não por falta de vontade – assim você garantiu -, mas para que você pudesse resolver tudo e pudesse ficar bem de novo. E que passar por tanta coisa comigo em tão pouco tempo poderia, segundo você, representar um sinal de que fosse mesmo pra gente ficar junto. À medida que você tecia o seu discurso emocionante sobre a dificuldade dessa decisão, sobre o quanto você não queria isso, eu assistia o seu descaso, notava uma indiferença crescente e tentava ser compreensivo. Quis te deixar no seu canto, me preocupei com a sua distância enquanto você agia com um intuito posteriormente assumido de me machucar. Responsabilizei tudo o que você estava passando e quis me convencer que a sua postura era justificável diante das circunstâncias. Quis acreditar que você desejava mesmo continuar me fazendo algum bem. Acreditei tanto nas suas palavras, achei realmente que você quisesse voltar pra mim, me convenci de que não havia outra forma que fosse melhor senão a sua. 
A verdade é que você não partiu por pressões externas ou o que quer que fosse. Não foi pelo bem da humanidade ou de nós dois, não foi um grande sacrifício, não foi sequer pelas suas malditas oscilações. Deve mesmo ter sido por um conjunto, mas sua falta de vontade foi de longe o maior dos fatores. É, demorei muito, mas agora, depois de tanta pancada eu percebo. Queria que você agisse da maneira que você fala. Seu discurso e suas ações são tão incompatíveis, entende? Mesmo quando avisado eu optei por não ver. Estive tão empenhado em fazer dar certo que nem atentei para a sua inércia. Nem considerei que a importância que eu tinha pra você era até onde dava, seus sentimentos até onde dava, sua preocupação até onde dava. O problema é dar tudo em limites tão mínimos e tão espalhados na sua zona de conforto. Assim fica fácil. É tranqüilo dizer tanta coisa e continuar na sua quando se trata de alguém não importante. E hoje, depois de decidir pulverizar tudo o que me machuca, finalmente eu entendi que você não serve nem pra chamar de meu amigo. Adoraria, de verdade, mas não posso ser amigo de quem eu não confio. Não consigo, porque até pra ser amigo a gente tem que se importar e contar com a ajuda do outro, isso vai muito além do que podemos fazer sem sair da nossa zona de conforto. Aceitar sua amizade diante de tanto descaso seu seria se contentar com o que resta. É como aceitar o que sobrou no prato de alguém só pra que a comida não vá parar no lixo. E isso sinceramente não serve pra ninguém, só pra jogar fora mesmo. Cansei das suas sobras, do seu desapego, do seu pouco caso. Cansei da sua não importância! Preciso de gente inteira, que me dê mais do que restos de tempo, dedicação e amor. Gente que faça mais do que apenas dizer que gosta de mim. Não basta você ser uma boa pessoa, se você não é bom comigo não serve e ponto. Talvez a gente se veja lá na frente e vire amigo ou até algo mais, talvez não. O destino é mesmo um maroto, não posso falar em impossibilidades. Mas para o que quer que ele nos reserve, se é que ele reserva algo pra gente mesmo, iniciativa alguma jamais partirá de mim. É que ainda que a gente ame, chega uma hora que a gente se cansa de dar o primeiro passo, ainda mais levando tanta rasteira de onde a gente esperava carinho. Mas sendo bem verdadeiro, eu não conto com isso, sangrei demais esperando qualquer retribuição sua. Seu lugar agora está oficialmente vago para ser ocupado por alguém que realmente valha à pena.  

"Te amo mesmo, talvez pra sempre. Mas nem por isso deixo de ser feliz ou viver a minha vida. Foda-se esse amor. E foda-se você."  (Tati Bernardi)

terça-feira, 20 de setembro de 2011

1 Month Ago...


(...)
— É que eu tenho medos, sabe? Medo de que as coisas não dêem certo, medo de não ser o momento, sei lá...
— Eu sei, entendo você. Eu também tenho esses medos. Mas sabe, e eu vou falar por mim agora, eu não quero deixar que o meu medo me impeça de viver tantas coisas felizes que estão acontecendo, entende? Eu não queria mais ter tanto medo do que quer que seja, quero dizer, eu não sei do futuro, sabe? Não sei o que pode acontecer amanhã, e a única chance de saber é não me apegando a esses temores, entende?  
— É, eu concordo com você...
— Não estou aqui falando em promessas e votos de pra sempre, sabe? Não quero construir ilusões nem prever o futuro porque eu não tenho essa habilidade. Estou olhando pro presente, e o meu hoje está tão bom, que há alguns dias eu venho me perguntando: por quê não? 
— Mas é que sei lá...Quer dizer... Na verdade eu nem sei o porquê de eu estar discutindo isso com você se eu concordo com tudo o que você disse. Você está certo e eu nem tenho como negar isso.
— Eu não sei bem se é questão de discordar ou concordar. Mas é que a gente nunca sabe qual é a chance da vida da gente, e se a minha chance for essa eu não gostaria de deixar ela passar, não quero que no futuro eu olhe pra trás, me lembre de você e me pergunte como eu poderia ter sido feliz, sabe? 
(...)
— E se eu te pedisse em namoro agora?
— Eu aceitaria!
— Bem, então...
Passei pelo menos dois dias tentando articular essa conversa. Imaginando expressões, momentos certos para o que quer que fosse e até respostas para qualquer réplica que você me lançasse. Pensei em mil maneiras de te falar tudo, de te dizer o que eu sentia e de como eu desejava que as coisas fossem dali em diante. Tinha medo de pular qualquer etapa, de me precipitar e perder tudo de tão especial que nós tínhamos até ali.
Os dias vinham seguindo numa tranquilidade e alegria que por alguns momentos parecia simplesmente inacreditável. Pouco a pouco você ia se tornando mais presente nos meus pensamentos e nossos momentos juntos carinhosamente recordados desde o primeiro deles.
Naquele momento, diante de você, enquanto toda a minha conversa mentalmente planejada ruía e dava lugar a um discurso improvisado, a minha mão tremia tímida e gelada sobre a minha perna de maneira que eu só conseguia perceber o quanto era bom estar contigo. Tudo o que eu mais queria era segurar a tua mão, te abraçar e assim permanecer por tempo suficiente para que fosse possível gravar cada detalhe do que estava acontecendo, para que eu pudesse sorrir cada vez que eu recordasse desse amor que estava por nascer.

— Bem, então o que você acha de nós... quero dizer... Você aceit...
— Ok,eu aceito!
Vinte de agosto, eu, perdido na minha fala confusa, tentava te pedir a chance de continuar retribuindo todo o bem que você estava me fazendo até que você me interrompe com um sim tão direto a ponto de me fazer feliz de uma maneira que eu nem lembrava mais ser possível de se sentir.


terça-feira, 9 de agosto de 2011

Reconstruindo Muros

E aí, por alguns instantes intermináveis, é como se o seu coração parasse. Confuso, você olha ao lado e não vê mais ninguém ali. Agora é só você e o que restou dos seus sonhos. Apenas dor, nada além de mágoa. Em pedaços você prende o choro, fecha a porta e sussurra o quanto é capaz de superar tudo isso. Então respira fundo enquanto aquelas fantasias aparentemente tão reais escorrem incessantes pelo seu rosto.
A gente sempre sabe que vai passar, sempre passa. O que não conhecemos é o quão profundas as marcas podem ser. Não há certeza de se a dor realmente deixa de existir ou se simplesmente nos acostumamos com ela. E até que o tempo dê essa resposta permanecemos latejando.
Sem que ao menos se perceba, o acaso se encarrega de sepultar aquilo que insistíamos em manter vivo. E lá está você esboçando um sorriso vacilante, de sinceridade tímida. Tomado pelo constrangimento quase familiar de um silêncio que te faz bem. Diante de medos sutis e dúvidas tranqüilas. Estranhamente alegre pela maneira inesperada como os acontecimentos tem se findado.
Aprender a ter os pés no chão quase nunca é fácil pra quem desde muito cedo se alimentou de sonhos  muitas vezes tão abstratos. Às vezes é difícil afrouxar os laços com algo tão inconstante como o futuro, para estreitá-los com um presente concreto. Mas se assim não for, como reconstruir os nossos muros?
Jamais descansaremos enquanto não entendermos que não podemos ter todas as respostas, que não importa o quanto somos fortes, nossas lágrimas ainda tocarão o chão de novo, e de novo. Nunca saberemos o que nos aguarda nesse futuro incerto enquanto continuarmos tentando juntar peças as quais só o tempo é capaz de encaixar.
Em algum momento a gente entende que aquilo que é palpável pode ser tão sublime quanto o idealizado, e que aquilo que é concreto pode vir a encantar da mesma forma. A diferença é que agora sabemos que direção seguir, e que por mais instável que seja o porvir, ele chegará quando aprendermos a viver um dia após o outro. 

sábado, 16 de julho de 2011

Entre O Sabor Da Novidade E A Opacidade Da Mesmice

É chegado o momento mais esperado do dia, enfim. Apressado ele se apronta para encontrar o ar lá fora. Apesar de estar cada vez mais contente com o seu trabalho, tudo o que ele queria era sair pela porta. Seu maior desejo era ouvir aquela voz há algum tempo tão familiar e desde sempre tão capaz de fazê-lo se perder de si mesmo. Exatamente como da primeira vez, talvez até mais forte, mas igualmente linda.
Sorridente, ele aguardava a chamada ser atendida, na expectativa de ouvir aquele “oi” que faz a gente sorrir por dentro, sabe? No intuito de ouvir qualquer história, de qualquer pessoa, de qualquer época, desde que fosse aquela voz que o narrasse. E lá estava ele, seu sorriso e o seu guarda-chuva sendo recepcionados com um carinho escondido em monossílabos, quase cansado.
E depois de ensaiarem aquela conversa repartida, comum, eles desligam o telefone, deixando com ele a indagação do que estava havendo de errado, numa indignação contida ele se perguntava para onde teria ido aquele entusiasmo, aquela alegria que ambos tinham um com o outro. Teria tudo ido embora a partir do momento em que a presença deles não era mais uma novidade?  
Sempre foi um tanto atrapalhado. Ansioso e desesperado, ele acabava falando muito, atropelando a si e aos outros nas palavras, como que numa tentativa egoísta de não deixar passar nenhum detalhe sequer. Mas independente de qualquer coisa, do que qualquer defeito que ele tem, seu amor esteve sempre aumentando, infinitamente maior e mais forte do que da primeira vez, sempre vê o mesmo sorriso como se fosse a primeira vez, e tenta sempre dizer o “eu te amo” como se fosse a última vez, para que seu amor seja sempre lembrado, para que seus frutos sejam sempre bons.
Recuso-me a corroborar essa anedota conformista de que só o novo é dotado de deslumbre, de que tudo com o tempo perde o seu encanto. Nego qualquer teoria que tire de mim o poder de temperar com novidade aquilo que já possuo. Porque se assim for, todas as minhas conquistas perderão o seu valor.
Sei que é a curiosidade que nos move, que nossos questionamentos e perguntas nos levam mais longe do que podemos imaginar. Porém, quando não restam mais porquês, quando eu percebo que já conheço cada palavra do teu sorriso, é que entendo que é a mim que cabe me deixar levar pela magia do que já tenho, pois se assim não for, do que valem nossas lutas?
O tempo pode ter o dom de envelhecer e tornar opaco tudo o que vemos nesse mundo. Mas o dom de te envelhecer, a capacidade de te tirar a cor que tens pra mim, só eu tenho. Por isso te mantenho a salvo e te protejo com tudo o que há em mim. Para que sejas para mim como uma novidade empolgante e motivante em cada batida do meu coração.