“Nem mais uma palavra escrita!” Essa foi a penitência que me dei depois
da última vez, quando escrevi e expus os meus cortes, um a um, todos em
carne-viva, numa tentativa de elevar a dor dos sangramentos ao máximo, pra doer
tanto que depois daquela agonia desesperadora que eu me provocaria, eu pudesse
finalmente não sentir mais nada.
Era isso, enfim. Havia desistido de escrever sobre os meus amores do
passado e também do futuro, achava que assim estaria afastando algum tipo
de maldição que eu acreditava ter. Parei porque estava cansado, farto de num
dia ser capaz de ver os milhões de tons das milhares de cores que havia em tudo
e no outro ver alguém indo embora e assim assistir o meu mundo ficando cinza
novamente. Ver a pessoa que amamos partir tem sempre uma angústia
desconcertante, é como ter o pavor latente de sentir alguma parte nossa sendo
amputada e, por puro reflexo, mexer cada membro do nosso corpo e confirmar que
tudo ainda está lá, e que por isso, por estarmos fisicamente inteiros, não há
anestesia capaz de resolver. A melhor das soluções que eu consegui pensar foi
ouvir o meu grito. E como que diante de um congestionamento, em algum lugar
caótico dentro de mim, eu reagia aos meus semáforos internos e me sentenciava:
“PARE!”
De lá em diante resolvi ceder ao meu instinto emergente de autoajuda e
cuidar de mim. Eu estava em pânico. Imaginar que agora eu seria a companhia de
mim mesmo era detestável, eu odiava a ideia sem sequer ter experimentado isso
de mim. Achei que não voltaria a me acostumar, que viveria à sombra dos meus
fantasmas, tive certeza que não suportaria. Não só suportei como fui feliz.
Pela primeira vez em algum tempo eu ri até que as lágrimas caíssem e solucei de
tanto chorar por coisas minhas, por um cotidiano massante, mas que era só meu.
Isso não deixava de ter algum encanto, afinal, eu, que sempre associei toda a
adrenalina emocional da minha existência a um ser genérico, lembrara que tinha
uma vida, mesmo que não conseguisse mais esboçar muitas linhas sobre ela ultimamente, por mais que eu tentasse. Eu quis por um freio em
apenas um detalhe, queria escrever sobre outras coisas importantes, mal sabia o
quanto esse pequeno detalhe era importante e determinante em mim.
Você apareceu e eu continuei respeitando a minha promessa com todo o
rigor. Era um desafio constante, sabe? Vi dezenas de versos escorrendo de você
e se acumulando na minha cabeça, que eu insistia em manter tão cheia. Era pra
te preservar! Era pra me preservar! Pra proteger qualquer coisa boa que
estivesse acontecendo. Eu tinha medo de por tudo no papel, não queria
desencadear uma contagem regressiva quando colocasse um ponto final. Por isso
eu reagia cético às suas investidas, entende? Custei a admitir que apesar de eu
ter estado muito bem sem você, tudo agora era muito melhor ao seu lado. Recebi
seus gestos de carinho receoso, temia continuar a querê-los e, apesar do meu
medo, aconteceu.
Não adiantaram as minhas placas de advertência, de nada valeu ter cavado
trincheiras emocionais. Não muito tempo depois do nosso primeiro beijo eu já
tinha o gosto como algo familiar, era cedo e eu já havia gravado muitas das
expressões do seu rosto, não raro eu as via quando fechava os olhos. Eu sorria.
Quis parar tudo, sair correndo antes de ser dilacerado de novo, fugir pra perto
de qualquer coisa que fosse preto-e-branco, de lá eu saberia o que esperar.
Lembrei que você não estaria lá. Desisti. Fiquei, mesmo tonto de tanto pensar.
Eu queria tanto dizer que sim ou que você dissesse que acabei me rendendo. Ali, à luz daquele sinal vermelho, o carro estava parado e o tráfego era tranquilo.Naquele momento eu resolvi desatar os meus grilhões e sair da minha cabeça. Seu olhar estava especialmente confortante e sua voz, num misto de grave e doce, consumou em resposta desconcertada ao meu pedido repentino. E por diante dessa alegria não caber silêncio é que eu escrevo. Sim, porque da mesma forma, não cabe recusa perante o seu abraço. Àquela altura eu já sabia não só mais das linhas, mas do título e aguardava o momento oportuno para que eu pudesse escrevê-lo, pra dizer que eu parei, eu parei de querer parar! Parei sim! Saí da minha cabeça, porque eu queria dizer não só da sua importância, ou de das suas qualidades, ou do seu sorriso que desarma tudo, mas, e principalmente, sobre o quão feliz eu estou por você estar aqui.
Cinza foram os dias que antecederam vc à minha vida. Preto e branco serão os que ainda estão por vir. E na aquarela que pintamos em nossos anos juntos, hoje eu me vejo querendo seus versos, sua inocência, sua verborragia, seus contornos e tudo que um dia tivemos juntos. Caso isso não seja mais possível, cabe a mim, resignado, aceitar que você foi começo, meio e fim. Que você foi luz e que me salvou de mim mesmo quando eu nem sabia que precisava ser salvo. Eu ainda amo muito você. E vez por outra, venho ler seu blog porque aqui ainda estamos juntos. Porque nessas palavras ainda é tudo colorido. E porque em seus textos, encontro paz! Um beijo fraterno e um coração cheio de saudades ficaram. E se você não souber voltar, seu espaço nunca será preenchido. E meu "sim" estará, como um eco, esperando alguém adentrar à caverna calando as repetições da minha voz e dizendo: enfim, cheguei.
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